segunda-feira, outubro 30, 2006

Derrota


Não sou bom para dar títulos. Até aos meus trabalhos tenho dificuldade de dá-los. Mas o título deste post poderia ser também o do filme que é a atual sensação no cenário cinematográfico carioca. Praticamente em todos circuitos inteligentes/interessantes a pergunta é a mesma: "Você ainda não assistiu A Pequena Miss Sunshine?" Mas o bochicho não se restringe ao Rio. Quem der uma circulada pela blogsfera vai encontrar posts e mais posts sobre essa comédia, dirigida por Jonathan Dayton e Valerie Faris. Por isso decidi assiti-la hoje. E não me arrependi.
De vez em quando um azarão acaba roubando a cena e virando o grande must da temporada cinematográfica. Quem não se lembra de O Fabuloso Destino de Amélie Poulain? Mas no caso de Miss Sunshine, estamos falando de um filme que tinha tudo para ser um fracasso (baixíssimo orçamento, nenhuma estrela e personagens losers e excêntricos). Acabou que desde o seu lançamento, em 28 de julho último, nos cinemas norte-americanos, esta produção independente tem causado sensação e faturado milhões de dólares.
Ao ler sobre todo esse sucesso você deve estar se perguntando o porquê do título. Pois Miss Sunshine é sobre fracassos e fracassados. Gente como a gente? Nem tanto. Afinal um velho que é expulso de um asilo por usar heroína, uma garota feiosa que sonha em ser Miss América, um adolescente fã de Nietzsche que faz voto de silêncio até entrar para a Aeronáutica, um professor gay que tenta o suicídio por ter perdido um aluno-namorado para um rival e um pai de família fracassado que tenta dar a volta por cima dando um curso sobre "Os Nove Passos Para se Atingir o Sucesso", não são pessoas que se encontra em qualquer esquina. Mas todos sofrem, desejam, sonham e se emocionam como a gente. Aliás, esse é o segredo do sucesso de Miss Sunshine. O roteirista Michael Arndt não se limita a nos contar a história. Ele nos envolve na trama. O problema dos personagens passa a ser seu também. Pelo menos por 1h e 45 m. Coisa que há muito não vejo no cinema.
Mas o cinema independente norte-americano de vez em quando nos surpreende com filmes feitos em cima de roteiros originais e personagens cativantes. Foi assim desde o esquecido e inesquecível Felicidade (de Todd Solondz, 1998) até o vencedor de quase todos os Oscars de 2000, Beleza Americana (de Sam Mendes), passando pelo impagável e provocador Bem-Vindo À Casa de Bonecas (de Todd Solondz, 1995). Mas não estou falando aqui de um filme que pretende apenas dar um pequeno panorama dos perdedores da América. Vejo mais emMiss Sunshine. O filme está sendo lançado numa época em que os EUA estão enfrentando um momento de fragilidade não vista desde os sufocantes anos 70 de Nixon. Economia instável, medo de ataques terroristas, isolamento cada vez maior perante o resto do mundo e decepção com o Bush, estão fazendo a América evitar olhar-se no espelho. E o pior na decadência é perder a pose. Os personagens de Miss Sunshine perdem a linha o tempo todo, porque percebem que não há futuro para eles. E nos momentos mais críticos, principalmente no final, quando não resta mais nada, eles se unem para lembrar que são uma família e que só a união faz a força. É como se quisessem lembrar aos americanos que com arrogância e individualismo é mais difícil atravessar sem ferimentos essa era bushiniana.
O filme é tão emblemático que há pequenas semelhanças com o clássico Vinhas da Ira (John Ford, 1940), sobre uma família que, nos tempos terríveis da Grande Depressão, perde sua propriedade no sul e ruma para a Califórnia num caminhão velho, em busca de vida melhor. A família Hoover de Miss Sunshine está indo para a Califórnia numa kombi caindo aos pedaços para que a caçula, Olive, participe e ganhe o concurso Miss Sunshine, que é a única coisa que lhes resta para tentar salvá-los da merda total. E o final é parecido com o do clássico de Ford. Não vou contar, mas o título deste post dá uma idéia. Mas tudo é levado com um humor inteligente e simpático. Você torce por eles, sofre por eles, como se torcia pela miserável família Joad em Vinhas...
Por tudo que já falei, acho que derrota maior do que a dos personagens do filme seria não assiti-lo.

15 Comments:

Anonymous Anônimo said...

A sociedade americana e muito conservadora, mas por baixo do pano todo mundo sabe o que rola de verdade e ai esses filmes que falam de "gente como a gente," fazem sucesso

quarta-feira, novembro 01, 2006 7:08:00 AM  
Blogger Jéssica said...

Passando rapidinho, depois volto pra ler com calma... Lindo dia pra vc, beijo*.*

quarta-feira, novembro 01, 2006 8:29:00 AM  
Blogger Vera F. said...

Júlio, só tenho lido críticas boas sobre o filme. Infelizmente não sei se chega até a minha cidade. Aí é esperar para ver em DVD.

Bjos.

quarta-feira, novembro 01, 2006 11:52:00 AM  
Blogger Ane Brasil said...

UEPA! agora fiquei intrigada! Assisti "as vinhas da ira" umas três vezes e recomendo pra todo mundo!
Li em algum blog - putz, num sei qual - que o tal filme era careta etc, etc... resumindo: meteu o pau no filme!
Agora vc coloca o bicho lá em cima! Hum, quer dizer que o troço promete.
Depois que eu assistir "Sexo orégano e Rock n'roll vou asisstir esse aí (passou na frente de Elza e Fred)
Sorte e saúde pra todos!

quarta-feira, novembro 01, 2006 12:12:00 PM  
Blogger Biajoni said...

pô, tou louco pra ver esse.

quarta-feira, novembro 01, 2006 4:23:00 PM  
Blogger Unknown said...

Oi Júlio!

Também já li críticas bem favoráveis a esse filme e a sua resenha está perfeita. Vou ver se assisto nesse fim de semana :)

quinta-feira, novembro 02, 2006 8:47:00 PM  
Blogger Duda Bandit said...

Olá, Júlio. Valeu a visita, fiquei todo bobo com o comentário.. Sua resenha me deu vontade de ver o filme, gostei de quando falou em "olhar no espelho". O espelho de próspero, ao que parece, trincou...

abração.

quinta-feira, novembro 02, 2006 10:47:00 PM  
Blogger Yvonne said...

Júlio, antes de mais nada, obrigada pela visita no meu cafofo. Tô morrendo de inveja porque como moro na roça não tenho condições de ver esse filme. Vai ficar para quando passar na tv a cabo. Beijocas

sexta-feira, novembro 03, 2006 6:40:00 AM  
Anonymous Anônimo said...

Grande Julio,

Dei uma olhada naquele site de "críticos" que você me enviou. A resenha (estou sendo bacana em chamar aquilo de resenha) sobre o "Arte de Odiar" é realmente cômica.

O sujeito falou em "pretensão" diversas vezes, mas pretenciosa é a iniciativa daquele pseudo-portal literário.

O mais curioso é que a seção "Críticos" ainda está em construção (*rs).

Bem que você avisou que eu daria boas risadas. ;)

Um abraço.

sexta-feira, novembro 03, 2006 9:47:00 AM  
Anonymous Anônimo said...

julio, imperdível. abraço e obrigado pela 1ª visita.
Apareça

sexta-feira, novembro 03, 2006 2:23:00 PM  
Anonymous Anônimo said...

Julio, estou aqui a retribuir a visita e não deixar de rebater a ameaça. Eu também gostei e volto. A propósito, vou ver este filme nesse fim de semana. Tem muita gente falando dele. Abraços.

sexta-feira, novembro 03, 2006 2:27:00 PM  
Anonymous Anônimo said...

E o mais interessante: um filme sem astros, só com atores. O elencaço já vale a ida. Abraço.

sexta-feira, novembro 03, 2006 3:12:00 PM  
Blogger Jéssica said...

Olá, Julio eu de novo aqui, desejando um final de semana tranquilo a vc e sua família... e sempre aguardando a honra de uma visita sua no meu 'lugar gostoso'. Eu não sou de desistir fácil, viu?...rs...
Beijo*.*

sexta-feira, novembro 03, 2006 3:32:00 PM  
Blogger Duda Bandit said...

salve, júlio...

vc me sugeriu uma nova música do Baker para meu conto (aquele do strip, lembra?), tava com deep in a drean, e acho que tem razão, escrevi ouvindo a música mas não casou com o produto. valeu a força. ainda não ouvi a que me indicou, mas tou pensando em love for sale.

abração
Saulo, (duda bandit)

sábado, novembro 04, 2006 5:14:00 PM  
Anonymous Anônimo said...

Este comentário foi removido por um administrador do blog.

sábado, novembro 04, 2006 9:29:00 PM  

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