sexta-feira, maio 29, 2009

O dia em que amei Dolores

Quando o guitarrista da banda psicodélica Jefferson Airplane, Marty Balin, natural da cidade, descreveu São Francisco, nos anos 60, como "49 milhas de sonho cercadas de realidade", talvez, por ser um notório doidão, não tivesse noção do quanto estava certo.
Uma vez, o jornalista e escritor carioca Heitor Cony descreveu a beleza do Rio como carnavalesca, com Pão De Açucar, Corcovado, Pedra da Gávea, Dois Irmãos e Lagoa Rodrigo de Freitas desfilndo na frente do turista, como carros alegóricos.
Na época, achei certo exagero. Mas hoje eu o compreendo melhor.
É que a beleza do Rio é muito fácil. A cidade entrega tudo de bandeja ao visitante. Você sai do Aeroporto Santos Dumont, pega um táxi em direção à zona sul, pega o Aterro do Flamengo e pronto. Vc já fica encantado com a cidade, ao ver o parque, o Pão de Açucar, a Baía, o Cristo e tudo mais. Até há muita coisa no Rio para ser descoberta, mas, no geral, o visitante não precisa fazer muito esforço para encontrar suas belezas. O mesmo acontece com cidades como Florianópolis e Salvador, por exemplo. Ou locais como Noronha, que já mostrei aqui.
Como também já foi mostrado aqui, que cidades como Paris, Londres, São Paulo, Boston, Buenos Aires ou Nova Iorque, precisam ser descobertas, exploradas. Elas não são tão generosas.
Lisboa seria um meio termo. Ela esconde o jogo, mas também é muito boazinha em determinados momentos.
Com San Francisco acontece o mesmo, só que de um forma diferente, pois o que há para ser visto lá, por vezes, foge completamente do que se espera de uma grande cidade e, não raro, chega a ser surreal.
A imagem de São Francisco por muitos anos esteve tão ligada ao psicodelismo que eu achava que era a própria cidade que estimulava o uso de alucinógenos. Mas agora, a conhecendo, eu não entendo por que os malucos dos anos 60 gatavam tanto dinheiro e tempo com drogas, vivendo numa metrópole que lhes proporcionava imagens como aí em cima (trilha da Califórnia Costal Trail)? Com a exceção do Rio e, talvez, de Floripa, não conheço outra cidade grande no mundo que pode nos proporcionar tal beleza dentro do seu perímetro urbano.
Esse talvez seja o lado carnavalesco da beleza de Frisco. Mas não é tão fácil de se descobrir. A California Costal Trail é bem pouco divulgada, vi poucos turistas por lá. Mesmo por que, é preciso disposição para percorrê-la.

Me responda, por favor: Para quê usar drogas, vivendo numa cidade em que dentro do seu perímetro urbano, você se depara com uma imagem desta aí de cima?
Se drogar para quê se já vive a viagem de morar numa das maiores metrópoles americanas, em cujo o principal meio de transporte é esse aí de cima?Para quê encher a cara de drogas se você mora numa metrópole norte-americana, em que os grandes prédios ocupam apenas uns 5%, numa pequena região, conhecida como o Financial District e que o espaço restante da cidade é composta, quase que totalmente, por ruas como a de cima, com casarões em estilo vitoriano inglês do século 19?
Quer coisa mais alucinógena do que sair do trabalho no tal Financial District e ir ao Embarcadero - local onde se pega os ferry boats e onde há dezenas de bares e restaurantes -, há poucas quadras, e pode fazer o happy hour, ao cair da tarde, com esse visual ao fundo?

Qual droga pode dar barato maior do que, casualmente se chegar no alto de uma das milhares de ladeiras da cidade e ver essa imagem?
Há loucura maior do que sair para caminhar no Fisherman´s Wharf, bem no Centro da cidade, e deparar com um leão marinho dormindo tranqüilamente no deck?
Sim, há. Você caminhar pelo mesmo Fisherman´s Wharf e deparar com um Woodstock de leões marinhos.


Você consegue imaginar uma metrópole dentro da terra do "tempo é dinheiro", nos dias apressados em que vivemos, que maném uma rua como essa...

...em que os carros têm que descer em zig zag, como em um balé, por entre jardins floridos?
Pode ser real, uma cidade com uma rua dessa há poucos quarteirões do Centro da Cidade?
Veja que loucura que é a Lombard Street vista do alto. Nem numa overdose de LSD um paulistano ou um carioca se imaginaria fazendo balé com o seu carro indo para o seu trabalho, na hora do rush.
Voltando a falar em Dolores, quero dizer, Dolores Park, é uma pequena área verde, encravada no bairro Mission, há poucos quarteirões de Castro, a área gay mais famosa do mundo.
Ali, todas as tardes de sol, um número razoável de pessoas de todos os tipos se reúne para assistir o sol morrer.
Até aí, nada demais. Mas com um palco mais de atenção, você percebe que não está num lugar qualquer. Ao seu lado, pode estar um casal de idosos fazendo ioga, ou um casal gay namorando. Do outro lado, pode estar um oriental namorando uma latina ou uma loura atracada com um negro. Na sua frente, pode estar um casal gay brincando com os filhinhos ou um grupo de marmanjos jogando baseball. Jovens punks ou emos podem estar curtindo um som numa rodinha ou um grupo de meia idade pode estar fazendo tai tchi chuan. Uma jovem pode estar meditando, enquanto um grupo de jovens conversa, enquanto queima um baseado. Mais adiante, uma senhora pode estar brincando com os seus cães, enquanto que à sua esquerda, estar um casal de meninas tomando um vinho branco, enquanto fazem um picnic.
Tá certo, em outros lugares do mundo você pode encontrar pessoas de todos os tipos curtindo em paz um pôr do sol. Como o Arpoador, aqui no Rio, por exemplo. Mas a diferença está na atmosfera, no clima de harmonia com freqüencia tão diversificada. Nunca encontrei isso em outro lugar. A impressão que você tem é que as pessoas não estão ali apenas para ficar em paz enquanto o sol morre, mas sim porque elas vivem em paz. Claro que deve haver gente ruim em São Francisco, inclusive existe criminalidade. Mas, de alguma forma, você se sente a salvo ali. Definitivamente não é necessário droga nenhuma para se perceber que há um astral positivo nessa cidade. E Dolores Park parece ser o epicentro dessa zona de conforto, que é Frisco. Você chega até a pensar que essa coisa de que o sonho acabou é uma mentira de quem nunca esteve em Dolores Park, onde as pessoas vivem a sua vida como querem. Se a paz cheirasse mal, o fedor ali seria insuportável.
Ah, quem são essas figuras? Sei lá! Atores? Dançarinos? Doidões? Não importa. Importa? Pelo menos não, em Dolores.

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3 Comments:

Blogger Marco said...

Grande Julio,
pelo visto, you left your heart in San Francisco...
mas também, com um visual desses, quem não deixaria o coroação e a mente? Uma amiga minha esteve dando um rolé pela costa oste norte-americana e falou maravilhas de San Francisco, de Carmel, de outras cidadezinhas da região. Eu só conheço San Francisco de vê-la em filmes. Fico encantado com o bonde, as ruas em zigue-zague, as ladeiras, a limpeza, a falta de pichadores que emporcalham cidades...
Sua postagem me fez muito bem. Vou ler a de baixo que também fala dessa encantadora cidade.
Carpe Diem. Aproveite o dia e a vida.

sexta-feira, maio 29, 2009 11:16:00 AM  
Anonymous DO said...

Fiquei impressionado,JULIO. Não conheço a cidade,mas babei aqui. Sério que os tais leões marinhos são encontrados na cidade/ Bárbaro!!

Fiquei aguçado,rss
Abração!

sexta-feira, maio 29, 2009 12:44:00 PM  
Blogger Julio Cesar Corrêa said...

Marco e DO, vcs não têm noção o quanto a cidade é bonita e receptiva.
Estou muito enrolado, depois, passo para visitar.
abraços

terça-feira, junho 02, 2009 7:46:00 AM  

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