sexta-feira, julho 30, 2010

Cenas de Violência Urbana

CENA 1: Domingo, Rio de Janeiro, 11 de outubro de 2009. Houve uma corrida no Aterro do Flamengo e as pistas haviam sido fechadas. Eu havia pedalado até o Leblon e estava voltando, quando as pistas do Aterro estavam começando a ser liberadas, na altura de um posto de gasolina ao lado do Iate Clube. A ciclovia passa entre a rua e o posto.
Os homens da guarda municipal estavam retirando os cones para liberar as pistas. Eu descia a toda pela ciclovia, pois tinha que voltar pra casa e arrumar as malas para viajar para Natal. O motorista da linha 128 (Leblon-Rodoviária) só precisaria esperar mais alguns segundos até que os cones fossem retirados e as pistas liberadas. Mas, impaciente, ele preferiu jogar o carro sobre a ciclovia e escapar do bloqueio.

Fui pego de lado. Caí de ombro. Mas como já tenho experiência com quedas, não me feri nada. Saí ileso, juntamente com a bike. Era uma bela manhã de domingo e a ciclovia estava cheia. Com a exceção de um ciclista gente boa, ninguém se indignou com a cena, ninguém parou, ninguém me ajudou. Me lembro que um frentista chegou a rir da minha cara. Os caras da guarda municipal também nada fizeram.
Graças a Deus nada sofri, mas poderia ter sido diferente.

CENA 2 - Na noite do último dia 20, alguns jovens se divertiam andando de skate, dentro da pista interditada para reparos, no Túnel Acústico, Gávea, zona sul do Rio. Um deles era o músico Rafael Mascarenhas, filho da atriz Cissa Guimarães. Policiais Militares permitiram que playboyzinhos dirigindo carros em alta velocidade entrassem no túnel interditado e o resto já virou um escândalo nacional.
Aí, eu pergunto: qual das duas cenas foi menos violenta? Carros fazendo pega em uma via interditada e supostamente deserta, por acidente atropelam e matam um jovem ou um motorista que atira um ônibus sobre uma ciclovia lotada?
De maneira alguma estou tentando diminuir a tragédia acontecida na Gávea. Mas é que quando se fala em violência no Rio de Janeiro, a primeira imagem que nos chega, geralmente é de traficantes fortemente armados em confronto com a polícia ou fechando ruas. Sempre achei que um ato de violência é aquele em que menospreza a segurança de uma pessoa. O motorista do ônibus que me atropelou foi muito mais violento do que os garotões que atropelaram o filho da Cissa. Creio que ele não tinha a intensão de me matar, mas colocou em risco a vida de várias pessoas que aproveitavam a manhã ensolarada para pedalar.

Dias antes do meu atropelamento, vi um carro importado avançar o sinal numa avenida perto aqui de casa, no momento em que uma mulher atravessava com um carrinho de bebê. Por sorte não ocorreu uma tragédia. Isso não saiu nos jornais, mas foi claramente um ato de violência.

Os playboyzinhos que mataram o filho da Cissa Guimarães foram violentos. Os PMs que permitiram que isso acontecesse também, assim como pai do atropelador que tentou abafar o caso, abrindo a carteira.
O motorista que me atropelou foi um monstro de violência. As pessoas que ignoraram o fato também. O frentista que riu  da minha cara também foi cúmplice da cena violenta. Enfim, traficantes armados são apenas um pingo no grande caldo da violência no Rio de Janeiro, uma cidade que há décadas enfrenta uma guerra civil não declarada e como não podia deixar de ser, seus habitantes parecem não ligar muito para a vida humana. Inclusive a sua.
Como diz Ernest Hemingway na foto ali em cima: "Pedalar uma bike é a melhor maneira para se perceber os contornos do seu país." Eu hoje vejo uma profundidade maior nesta frase. Pedalar pelas ruas do Rio pode nos dar os dois lados da moeda: as belezas de uma cidade e a constatação de que aqui a vida humana vale menos do que o caráter de quem joga um ônibus em cima de uma ciclovia lotada.
Aaaaah, as fotos que vocês estão vendo são de uma exposição que estava em cartaz na semana em que a cidade foi abalada pelo crime na Gávea e que é bacaninha a começar pelo título: Dreams on Wheels.
A exposição, patrocinada pela ONG do mesmo nome, viaja pelo mundo mostrando o esforço de várias cidades do mundo (Berlim, Sydney, Londres, Copenhagem, Paris, Nova Iorque, entre outras) para promover o uso de bikes como meio de transporte, a fim de tentar dar uma forcinha para a recuperação do clima, melhorar a qualidade de vida dos seus habitantes e também o trânsito.
A exposição podia ser vista até o último dia 25 no Centro Cultural Hélio Oiticica. Entre os dias 1 e 16 estará em Brasília. Depois, seguirá pelo mundo.
Na minha recente visita a Nova Iorque, percebi que o número de gente pedalando nas ruas estava bem maior do que o habitual, principalmente nos locais mais descolados como o Soho, Village, Chelsea e Nolita. Em Williamburg, Brooklyn, ao cair da tarde, o número de gente bonita e cool pedalando de volta do trabalho nos faz pensar estarmos em Pequim. Mas isso não é nenhum modismo. Trata-se de um movimento crescente de pessoas conscientizadas, procurando uma forma mais natural e humana de vida. Talvez isso explique o falto de não haver nenhuma foto feita em cidades brasileiras.
Não entendeu? Releia a CENA 1 e talvez você entenda.

* Mais detalhes sobre o Dream on Wheels, mergulhe aqui
* As fotos não estão muito boas devido a iluminação deficiente e eu estar sem flash.

Marcadores:

segunda-feira, julho 19, 2010

Uma canção, uma história

Muitas vezes, nós até gostamos de uma música. Sem saber que por trás desta música  existe uma história, ainda mais bonita do que a própria canção.
É o caso de You´ve Got a Friend (que você deve estar ouvindo).
Em 1970, Carole King era uma compositora nova-iorquina do Brooklyn muito prestigiada há uma década, quando criou clássicos da música pop americana como The Locomotion e Will you love me tomorrow. No ano anterior, King havia se divorciado de seu parceiro musical, o compositor e músico Gerry Goffin. Ela também havia acabado de lançar o seu primeiro trabalho solo, o belo Writer, que foi injustamente mal recebido pelo público e pela crítica.
Ela também conheceu James Taylor e se apaixonou por ele.
Taylor era, até aquele ano,  um obscuro cantor/compositor de estilo country, que também tinha fracassado feio com o seu primeiro solo. Apesar de ter sido apadrinhado por Paul McCartney. Taylor também estava vivendo o seu inferno particular: não conseguia se livrar do vício da heroína e nem das crises de depressão desde que sua companheira, Suzanne Schnerr, havia cometido suicídio.
Decidido a transformar sua dor em arte, Taylor compôs Fire and Rain, que seria o carro-chefe do seu próximo trabalho, Sweet Baby James (capa acima).
Aqueles eram tempos conturbados. O Sonho dos anos 60 estavam desabando, a guerra do Vietnam prosseguia e nada do que os jovens haviam idealizado nos últimos anos se mostrava possível de se realizar num futuro distante.Grande parte da juventude americana se sentia perdida, desiludida e abandonada pelos seus ídolos (Os Beatles haviam acabado de acabar, Hendrix & Janis estavam mortos).
A tristeza contida em Fire and Rain tocou fundo no coração de milhares de jovens e Sweet Baby James tornou-se um grande sucesso. Faturou o Grammy de disco do ano e vendeu mais de 10 milhões de cópias.
Taylor e King resolveram ficar juntos. E a América torcia por eles. Afinal, as afinidades entre os dois pareciam ir além da música e eles eram o casal que todos gostariam de ver envelhecendo juntos.

Infelizmente, a coisa não foi assim. Por algum motivo, os dois se separaram. A decisão foi de Taylor. Ele até amava Carole, mas entre eles havia a heroína. E James não queria que aquela garota tão legal sofresse com um viciado praticamente destinado a aparecer morto com uma seringa enterrada no braço, como muitos naqueles tempos.
Enfim, James Taylor e Carole King, o casal mais badalado da música pop, em 1970, não estava mais junto. Ao lerem a notícia na mídia, os fãs ficaram tristes. Não tanto quanto Carole. E ela decidiu também transformar seu sofrimento em arte.

"Eu amo você. E amo tanto, que se você for memo mais feliz sem mim, então, tudo bem. Pode ir. Mas se por acaso precisar de mim, lembre-se de que você tem uma amiga e não hesite em me procurar. E eu estarei logo ao seu lado." Esse parece ter sido o pensamento de King ao escrever para o amigo viciado, a clássica You´ve got a friend, que diz mais ou menos assim:

Quando você estiver abatido e confuso

E precisar de uma ajuda,

E nada, nada estiver dando certo,

Feche seus olhos e pense em mim

E logo eu estarei lá

Para iluminar até mesmo suas noites mais sombrias.



Apenas grite o meu nome

E você sabe, onde quer que eu esteja

Eu virei correndo, oh sim, querido,

Para te encontrar novamente.

Inverno, primavera, verão ou outono,

Tudo que você tem de fazer é chamar.

E eu estarei lá, sim, sim, sim,

Você tem um amiga.



Se o céu acima de você

Tornar-se escuro e cheio de nuvens

E aquele antigo vento norte começar a soprar,

Mantenha sua cabeça sã e chame meu nome em voz alta

E logo eu estarei batendo na sua porta.

Apenas chame meu nome

E você sabe, onde quer que eu esteja

Eu virei correndo para te encontrar novamente.

Inverno, primavera, verão ou outono,

Tudo que você tem de fazer é chamar

E eu estarei lá, sim, sim, sim.



Hei, não é bom saber que você tem um amiga?

As pessoas podem ser tão frias,

Elas te magoarão e te abandonarão

E então elas tomarão sua alma se você permitir-lhes.

Oh, sim, mas não permita.



Apenas chame alto meu nome

E você sabe, onde quer que eu esteja

Eu virei correndo para te encontrar novamente.

Babe, você não entende que

Inverno, primavera, verão ou outono,

Hei, agora tudo que você tem a fazer é chamar...

Senhor, eu estarei lá, sim eu estarei,

Você tem um amiga,

Você tem um amiga.

Não é bom saber? Você tem um amiga...

Não é bom saber? Você tem um amiga...

Você tem um amiga...

E como amigos, eles continuaram trabalhando juntos. Em novembro de 1970, por exemplo, Taylor e King apareceram num concerto dele, na famosa casa de espetáculos Troubadour, em Los Angeles. Enquanto, que ele aceitou a participar das gravações do próximo trabalho dela, o antológico Tapestry, lançado no início do ano seguinte. E abrindo o lado B, lá estava You´ve got a friend.
Uma grande parcela da juventude norte-americana continuava perdida, triste, e daria tudo para ouvir de alguém o que Carole disse para Taylor nessa música. E Tapestry foi um sucesso avassalador. Bateu recorde de vendas, ficou até 1977 no top 40 da Billboard, foi eleito o disco do ano de 1971 e deu a King o Grammy de cantora do ano. Nele, além da canção motivo deste post, há clássicos como It´s too late e So far away.
O própio James Taylor incluiu You´ve got a friend em seu disco daquele ano, o belo Mud Slide Slim and the Blue Horizon. Lançado em maio de 1972, o compacto onde ele interpretava a canção feita pela amiga, vendeu um milhão de cópias em apenas uma semana. Isso significa que um milhão de pessoas compraram o single por causa da canção. Quantas sabiam da bela história de amor e amizade por trás dela?

De qualquer forma, a fila tem que andar e Carole King seguiu sua vida. Viu o amigo Taylor se casar naquele ano com Carly Simon e ter com ela um relacionamento infeliz que acabou ruindo nos anos 90. Ela teve uma carreira marcada por alguns bons álbuns, meteu-se em política (apoiou recentemente tanto Hilary Clinton quanto Obama) e com assuntos do meio ambiente. Também fez pequenas aparições em séries de tv.
Ainda encontrou tempo para casar, criar filhos e se tornar numa bela senhora de 68 anos.

Em 2007, James Taylor e Carole King estavam sossegados em seus cantos quando a famosa casa de espetáculos Troubadour (lembra-se) quis comemorar os 40 anos de sua existência relembrando alguns dos shows memoráveis ocorridos ali. E alguém lembrou-se daquela longínqua noite em novembro de 1970, quando Taylor e King dividiram o palco.

Os dois aceitaram o convite para cantar extamente numa noite de novembro de 2007, 37 nos depois, por tanto. Um longo período durante o qual muita água havia rolado debaixo da ponte. Os dois já estão casados com parceiros diferentes, mas bem que poderiam estar juntos, pois ainda formam um casal simpático, não acha?
O sucesso do show no Troubadour fez a dupla anunciar, exatamente dois anos depois, um excursão mundial juntos. Além do lançamento do cd duplo com o concerto daquela noite de 2007.

A excursão começou em março último e tem sido um sucesso retumbante. Em alguns lugares, os ingressos se esgotaram um mês antes. Em outros, chegaram a superar em vendas, a final da liga nacional de baseball.


Em um dos shows, na Austrália, a atual queridinha do pop mundial (lugar que Carole King ocupou há quase 40 anos) Lady Gaga, fez questão de cumprimentar a dupla nos bastidores.

As vendagens do CD também está bombando e trouxe de novo a dupla aos primeiros lugares da parada americana, feito que ambos não conseguiam há muitos anos.
Infelizmente, pelo que parece, a excursão não passará pelo Brasil e só nos resta memos curtir este belo disco, que já tratei de colocar na minha prateleira de cds.
O trabalho é muito bom. Com a dupla de amigos cantando juntos apenas sucessos dos anos 70, que já tornaram-se clássicos, como Country Road, Fire and Rain, It´s too late, I Feel The Earth Move e You Can Close Your Eyes.
Vale para se ver que, pelo entusiasmo do público, a dupla entrou mesmo para a eternidade ou para ver a emoção dos dois ao cantarem juntos You´ve Got a Friend. Um dado interessante é que a banda que está acompanhando os dois é a mesma que os acompanhou no concerto de 1970.

Tá certo, algum chato vai dizer que a excursão e o CD são oportunistas, uma jogada de marketing que serve para alavancar a carreira de dois astros que haviam caído no ostracismo.
Pode até ser, mas quem leva isso em conta, certamente não conhece a história de You´ve got a friend e não percebe a magia deste reencontro.
Não percebe que 40 anos se passaram desde que um cara legal mas problemático chamado James e uma garota bacaninha chamada Carole ficaram juntos e se separaram para o bem de um do outro e iniciaram uma amizade que já dura quatro décadas. Quantas amizades hoje durarão quatro décadas? Aliás, sempre achei a amizade mais importante do que o amor. Porque se o relacionamento não passar pelo estágio da amizade, é melhor cada um ir para um lado.
O chato que apenas enxergar oportunismo na volta desses dois artistas geniais, não será capaz de se emocionar com a linda história de amor que há por trás. O verdadeiro amor. Aquele que é capaz de abrir mão, capaz de se sacrificar ou até de sofrer pelo bem do ser amado. Será que este tipo de amor é coisa do passado? Hoje em dia, você liga o rádio e só ouve canções sobre o amor. Mas que tipo de amor está se referindo? Hoje, eu vejo jovens casais se agarrando em lugares públicos e me pergunto quantos deles seriam capaz de ter o mesmo desprendimento de Carole King? Quantos deles, ao terminarem, permaneceriam amigos de verdade?
Talvez esses sejam questionamentos de uma pessoa que está envelhecendo. Pode ser. Mas o meu consolo é ter vivido na época do verdadeiro amor e ter estar ainda vivendo um amor verdadeiro. Daqueles que são vacinados quanto o tempo, mas que se mesmo assim, acabarem, darão início a algo mais lindo: a verdadeira amizade.
* Na trilha sonora You´ve got a friend na versão de Carole King e na de James Taylor.

Marcadores:

sexta-feira, julho 09, 2010

Imagens e Pensamentos I - Pretinho básico


"Ok, men are like subway trains."
Foto tirada no final da madrugada de um sábado de maio, em uma estação do Lower East Side, NY.
Era aquela hora do dia em que as pessoas costumam ter pensamentos tolos. Acredito que a loura pensava nisso enquanto checava se ele havia ligado, enquanto tentava não se lamentar pelo fato de mais uma noite ter terminado sem conseguir alguém que o substitua e enquanto esperava o trem do metrô. Que, por vezes, demora, mas sempre aparece.

* De posse da minha primeira câmera DLSR, estou me sentindo um fotógrafo e agora vocês vão ter que me aturar.

Marcadores: