domingo, novembro 29, 2009

Parte do meu décimo terceiro já tem endereço certo

Parece ser bom. Gostei da chamada.

terça-feira, novembro 17, 2009

Coisas que a gente lê, vê ou ouve e não pode deixar passar 4




"As mulheres



Depois de um longo percurso



Ficam louras



Como último recurso."



Eliane Pantoja Valdya
Uma das poesias mais espertas e realistas que já li.


E fui convidado a participar como escritor fixo do site Caneta, Lente e Pincel. E já tem conto meu publicado .

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terça-feira, novembro 03, 2009

O dia em que o sonho morreu

Era para ser um evento pequeno. Os Rolling Stones queriam comemorar o sucesso da sua turnê norte-americana, naquele segundo semestre de 1969 com um concerto gratuito. Em agosto, o mundo todo havia podido admirar a grande festa dos quinhentos mil jovens em Woodstock, que fez todos pensarem – nem que fosse por alguns minutos – na possibilidade de um mundo melhor. Os Rolling Stones não foram convidados para Woodstock. Não que eles não merecessem ir, mas não se tinha dinheiro para contratá-los. E Mick Jagger, com o seu ego woodstockiano de leonino, sentiu-se rejeitado. Então, o senhor Jagger decidiu fazer o seu Woodstock particular. E nenhum evento pode ser pequeno quando um leonino rejeitado decide se vingar. E daqui a algumas semanas estarão se completando 40 anos de um evento que nenhum roqueiro da antiga nem sequer quer se lembrar.
Marcado para 6 de dezembro, o tal concerto gratuito seria realizado no Golden Park, em São Francisco (o qual conheci este ano e sobre o qual já falei aqui). Foi anunciado como o Woodstock da Costa Oeste. Por isso, 24 horas depois de a prefeitura da cidade conceder a permissão para um evento para 150 mil pessoas, cerca de o 300 mil já haviam chegado a São Francisco, vinda de todas as partes dos EUA. Temendo um tumulto, o prefeito voltou atrás. E os Rolling Stones tiveram que procurar desesperadamente outro lugar para o seu Woodstock. Alguém se lembrou, então, de um autódromo abandonado, há poucos quilômetros de São Francisco. Altamont ficava na região serrada ao redor da Baía. Não era um lugar adequado e qualquer pessoa sensata, desistiria. Mas nada pode deter um leonino magoado.




A segurança de Woodstock havia sido feita por voluntários. Mick Jagger quis que a segurança do seu evento fosse feita por os perigosos motoqueiros Hell Angels, experiência que já havia dado certo em Monterey Pop, em 1967, e no antológico concerto dos Stones no Hyde Park, em junho daquele ano.

Mas os líderes dos Hell Angels de São Francisco estavam na cadeia, cumprindo pena por assassinato. E sem os seus líderes, os motoqueiros – mundialmente conhecidos por sua violência -, simplesmente surtaram.

Aliás, os tempos haviam mudado. Os dias de paz & amor, na época de Monterey Pop estavam mesmo acabando. Uma grande parte da juventude americana havia passado da inocente maconha ou das viagenzinhas de LSD para coisas mais perigosas. O abuso de drogas tomava proporções epidêmicas no país. Para se ter uma idéia, naquele mês de dezembro, as autoridades de saúde da cidade de Nova Iorque comunicavam que apenas nos últimos 12 meses, haviam ocorrido 900 casos de overdose de heroína. A maioria das vítimas tinha menos que 20 anos.
Essa mistura de platéia alucinada e Hell Angels surtados não poderia dar em boa coisa. O olhar de ódio do Hell, com seu bigodinho hitleriano, acima, para o Mick Jagger, dá uma idéia da tensão que pairava no ar. Assim como a frieza dos Hells, sorrindo indiferentes ao pânico da platéia, tentando fugir da pancadaria e das loucuras que rolavam na escuridão lá atrás. E as fotos a seguir não mentem...
Brigas, agressões e piração por abuso de drogas aconteciam a cada minuto, como o caso dessa jovem nua - apesar da temperatura estar pouco acima dos dez graus -, completamente pra lá de Mahakesh, que passava por cima de todos, numa tentativa tresloucada para chegar até o palco. E devido ao frio, o abuso de álcool para se aquecer tornava as coisas ainda piores.
Toda vez que os Rolling Stones tentavam cantar uma música, um clarão abria-se na platéia.
E toda vez que a violência explodia na platéia de mais de 500 mil jovens, a multidão tentava se abrigar próximo ao palco. Mas era recebida por Hell Angels ferozes.
A imagem dos Hells abrindo passagem à força pela platéia, antes do início do concerto, já dava uma mostra do que estava por vir. Aliás, Altamont não foi um concerto só dos Stones. Santana, Crosby, Stills, Nash and Young e os novatos do Flying Burrito Brothers, estavam entre os convidados. O concerto do Jefferson Airplane teve que ser interrompido porque o guitarrista, Marc Ballin, foi nocauteado por um Hell raivoso. Outra banda de São Francisco, Greateful Dead, chegou, mas nem subiu no palco. Foram aconselhados a dar meia volta, tamanha confusão que pairava no local.
Se o senhor Jagger não tivesse um ego tão grande, teria interrompido aquela doideira. Mas preferiu continuar cantando num palco repleto de Hell Angels descontrolados (na foto, um deles aparece espancando o rodie da banda).
Então, o pior aconteceu, quando um jovem negro de 18 anos, Meredith Hunter (o vulto de verde na foto acima) - talvez, alucinado por drogas -, teve a infeliz idéia de sacar e apontar uma arma para Mr. Jagger. A foto também mostra o momento em que ele foi agarrado por um Hell com um facão em punho.
E a coisa foi resolvida segundo a Escola Hell Angiana de Diplomacia: com várias facadas fatais. Isso tudo na frente de uma platéia chocada e Stones apalermados.
Finalmente a ficha caiu e Mr. Jagger percebeu que havia ido longe demais.
Então, os Stones decidiram rapidamente dizer bye-bye, cantando cinicamente Satisfaction...
...e sairam batidos de helicóptero, deixando para trás, 500 mil jovens perplexos.
O que era para ser um evento pequeno, mas motivado por um ego enorme. E tudo foi documentado de forma magistral em Gimme Shelter, documentário de Albert Maysles, David Maysles e Charlotte Zwerin, que estreiaria uma ano depois e é considerado o melhor trabalho do gênero sobre rock.

Na entrevista coletiva que se seguiu à tragédia, um Mick Jagger ainda atordoado, tentava explicar o fiasco com a seguinte frase: "Muita gente diz que Altamont marcou o fim de uma era. Mas na verdade marcou o fim da inocência dos caras que ainda acreditavam nela." Pode ser. De qualquer forma, Altamont foi um marco triste na história do rock e da juventude dos anos 60, que aliás estavam terminando mesmo. A esperança que Woodstock havia construído, Altamont destruiu em poucas horas. Tá certo que uma sociedade igualitária e justa é uma utopia, que o individualismo talvez nunca seja vencido, que acabar guerras com flores, dedos em V e gritando paz & amor é uma inocência sem noção. Tá bom que vencer a sociedade de consumo com boas intensões é o mesmo que tentar vencer o diabo com orações. Tá certo que a revolução sexual foi um blefe e que subestimar as drogas foi um erro sem proporções. Tá certo que foi tudo ilusão e que ninguém pode, segundo Vinícius, viver longe da realidade impunimente. Mas certamente havia maneira melhor de mostrar isso do que Altamont.
E a imagem da jovem chorando na beira do palco, enquanto assiste ao seu mundo desabar, é simbólica.
Era para ser um evento pequeno. Mas, além do jovem negro esfaqueado, mais três mortes ocorreram: uma jovem morreu afogada em um lago, ao tentar fugir de Hells que queria estuprá-la, um jovem morreu atropelado pelas pesadas Harley Davidson e um outro foi espancado até a morte numa briga. Ops! Eu disse três? Na verdade foram quatro. O sonho de toda uma geração também foi pro brejo naquele 6 de dezembro de 1969.

Todas as fotos deste post - com a exceção do poster do filme - foram tiradas do sensacional site Morethings .


* Na trilha sonora Gimme Shelter, canção que os Stones compuseram para o documentário e que está no Lp Let it Bleed, 1970.

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