sábado, novembro 29, 2008

Buchicho no Chiado



Anoitece em Lisboa. O que fazer? Ou melhor: onde fazer o quê? Dez entre dez blogs que visitei quando estava planejando esta viagem me disseram "Vá ao Chiado." Então, tá. Coloquei o lugar na minha agenda, decidido a ir logo na primeira noite, sem saber o que me esperava.


"É a Lapa de lá.", eu havia lido. Mas encontrei muito mais do que isso. É uma boemia portuguesa, com certeza. Mas o que vi ali, dificilmente sairá da minha mente.

Imagine uma Lapa sem flanelinhas, sem trânsito caótico, sem moradores de rua, sem policiamento excessivo, sem sujeira e sem dificuldades para se estacionar. Pois é, por entre ruelas e ladeiras apertadas, uma multidão de turistas, estudantes, imigrantes, artistas, gays, emos, punks, junkies, boêmios, neo-hippies, namorados, enfim gente de toda a espécie, vai caminhando, como numa perigrinação, à procura da sua turma, ou o seu bar. E quem escreveu (vergonhosamente não me recordo o nome do compositor) os famosos versos daquele samba clássico que diz:"Enquanto a cidade dorme, a Lapa fica acordada, acalentando quem vive de madrugada", não deve ter conhecido esse bairro lisboense, que realmente recebe qualquer um de braços abertos.
Há lugar para todos. Do hype ao tradicional; do indie ao eletrônico; do turístico a lugares de imigrantes; do conservador ao GLS; do simples ao cool. Se você não encontrar onde se encaixar é porque você simplesmente não existe. Assim como acontece na Lapa carioca, todos tem seu lugar e convivem pacificamente, mas sem se misturar.

A princípio, você fica meio com o pé atrás de andar pelas ruelas nem sempre bem iluminadas. Mas é difícil resistir ao convite daquele buchicho, aquelza confusão de gente, cheiros e, principalmente, sons. Tecno, Rock, Indie, Psicodelic, MPB, Tribal e música de países do oriente médio se confundem numa verdadeira salada cultural, que torna o Chiado o lugar mais fantástico que conheci na Europa, superando até mesmo o incrivel Soho londrino. Nunca pensei em encontrar algo assim em Portugal. Acabei voltando todas as noites e, hoje, morro de saudades.


Como era uma noite de quarta-feira, fui conhecer o famoso Tasca do Chico, sobre o qual eu já havia lido uma matéria na Time Out portuguesa. Era noite do evento Fado Vadio.
À princípio, parece um botequim despretensioso, desses que existem aos montes em qualquer capital brasileira. A música é ao vivo. De repente, alguém se levanta e começa a mandar um fado. Como se estivéssemos numa roda de samba ou num partido alto.

Achei legal e interessante, só que na noite que eu fui e o pessoal não parecia muito entusiasmado e poucos foram os que se aventuraram a cantar. Realmente é um lugar que merece ser conhecido.
Mas lugares com fado ao vivo não faltam no Chiado, um lugar que, por sua diversidade, é super moderno. Mas não perde o link com as tradições portuguesas. E por isso que até a minha viagem á Portugal, chiado era apenas um ruído desagradável. Agora, chiado será sinônimo de lugar inesquecível.
* Talvez, o único ponto negativo no lugar seja o tráfico de drogas que atua livremente. Diferentemente de qualquer outro lugar que já visitei, lá os traficantes lhe abordam, vendendo de tudo. É uma pena!


Madrugada em Lisboa. Salve a Lapa...ops! Salve o Chiado!

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domingo, novembro 23, 2008

Você já funiculou?

Eu funiculava todos os dias em Lisboa. Pra cima e pra baixo.

Para decepcionar sua mente suja, funicular é o ato de andar neste simpático teleférico que é o anjo da guarda das pernas cansadas dos turistas que precisam subir a ladeira da Bica


Ou você anda no funicular (teleférico) ou...
...encara essas simpáticas escadinhas. Mas para que tanto sacrifício? Bem...




O Bairro Alto é outra colina da cidade e está em estado muito melhor do que o Alfama. As ruas são mais bem cuidadas e percebe-se que há uma inegável valorização. Mais o charme é o mesmo. Lisboa foi semi-destruída por um terremoto em 1755. As famílias mais ricas, fugindo do caos que se instalou na parte baixa da cidade, mudaram-se para o alto das colinas. O Bairro Alto ainda guarda algum resquício dessa época. Não tem a naturalidade de Alfama, mas compensa em beleza.
É lá em cima que fica A Brasileira, o imponente restaurante, freqüentado por Fernando Pessoa. De cara, os cariocas lembram da Colombo, aqui no Centro do Rio. Só que a nossa Colombo é maior e um pouco mais sofisticada.
Os turistas adoram dar uma parada ali, na tentativa de "reviver" os áureos tempos em que o famoso poeta fazia ali suas refeições e papeava com amigos. Mas o lugar me pareceu uma das armadilhas para turistas que existem em qualquer lugar. De Fernando Pessoa...

...só mesmo a estátua em frente à casa, que ainda tem que segurar mochila de turista abusado. Ninguém merece!

Mas o melhor do Morro Alto é subir até lá no finalzinho da tarde e procurar um dos bares com varandão com vista para o Tejo e curtir a morte do sol. Não é como o pôr de sol à beira do Sena, em Paris. É outro tipo de beleza, outro clima. Mas a emoção é a mesma.

E lá embaixo? O que temos?
Temos, por exemplo, a Praça do Mercado, com o seu casario impar.
E lá fica o Martinho da Arcada, o primeiro restaurante de Lisboa, sempre repletos de turistas, que tentam "reviver os áureos tempos...".
O imponente portal da rua Augusta, a mais charmosa rua-calçadão que conheci. Depois de andar por ela, fica até difícil de encarar a Ouvidor, no Rio, ou a Direita, em Sampa.

O Elevador de Santa Justa é fascinante. Lembra o Lacerda, em Salvador, só que é mais pomposo. Atualmente é mais usado mesmo por turistas do que pelos nativos.

E a Praça do Rossio, ao anoitecer. Mas o Centro de Lisboa está longe de ser apenas isso. Mas a noite de Lisboa será o assunto do próximo post.

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domingo, novembro 16, 2008

DNA


A velha viúva de luto fechado está a comprar na vendinha. Proprietários cobram aluguel de uma inquilina, no grito, enquanto os vizinhos assistem. Imigrantes preguiçosamente tomam suas cervejas e turistas suados descem as tortuosas e estreitas ladeiras, cheias de construções centenárias, nas varandas das quais, lençois, roupas e toalhas estão despudoradamente estendidos em cordas. De repente, o cheiro de uma comida caseira nos assalta.
Velhas gordas com as pernas cheias de varizes, solteironas mal-humoradas, maridos magros e melancólicos e jovens sonhadoras. Personagens familiares e que ainda podem ser encontrados em alguns pontos dos subúrbios cariocas. Parecem terem sido tirados das obras do Nelson Rodrigues.
Depois da imponência e do compromisso com a modernidade, de Londres e depois da elegância e sofisticação de Paris, chegar em Lisboa foi um choque. Era final de tarde e comecei justamente onde Lisboa é mais Lisboa, na colina de Alfama, com suas ladeiras apertadas, suas vendinhas e suas casas, que lembram os velhos cortiços que existiam aos montes na parte central do Rio e de São Paulo.

Eu, que nasci nos subúrbio do Lins de Vasconcelos, no Rio, fiquei emocionado ao reencontrar o bom do Rio de Janeiro do passado, num lugar onde tudo - ou quase tudo - dá certo. É como se eu visse no que o Rio poderia ter se transformado se não tivesse perdido o rumo. Visitar Portugal é como viajar ao nosso DNA.
Aconcelho a todos que ainda não foram à Europa a fazer o que eu fiz: começar por Londres, depois Paris e finalmente chegar em Lisboa para saborear o delicioso choque.

Lisboa não quer ser elegante, tem uma sábia humildade para não querer ser pomposa e não tem pressa de ser moderna. Quer apenas caminhar pelo século XXI de mãos dadas com suas tradições. E aí que está o charme que nos fascina.


Praça do Mercado, vista do Alfama, a parte mais charmosa da cidade,...
...de onde se vê as ladeiras serpenteando caóticamente colina abaixo.
E é lá no alto da colina de Alfama que fica o Castelo de São Jorge...



O dia já ia morrendo e, apesar do cansaço, antes de o sol morrer, Lisboa já havia me ganhado.

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terça-feira, novembro 11, 2008

Pedra do Arpoador

Você não viu a Pedra do Arpoador? Pois nem poderia. Mas é nas margens do Sena que os parisienses vão curtir o pôr do sol, quase ao estilo dos ipanemenses, aqui no Rio. Só não chegam a bater palmas para o sol moribundo porque, você sabe, não há tanto calor humano.

Mas é lindo de ver! Alguns levam vinho e pães; outros, violão. Rapazes de terno e gravata, mães com carrinhos de bebês, adolescentes em grupos ou sozinhos com seus ipods, trabalhadores, namorados. É a mesma celebração, o mesmo entusiasmo para festejar o fim de mais um dia vivido.
Mas o dia ainda não acabou e barcos circulam rio abaixo, alguns oferecendo festas a bordo.





E a tardinha cai...

...o barquinho vai.

Enquanto isso, músicos veteranos tocam jazz nas pontes de acesso ás duas ilhas dentro do Sena, Cité e St. Louis.

Aliás, essas ilhas são os locais mais interessantes da cidade. Infelizmente, a maioria dos turistas atravessam as pontes apenas para conhecer as belezas da Notre Dame e para tomar os sorvetes da Berthillon. E estão apressados demais para curtir o clima de cidade do interior em pleno centro de Paris, que domina os pequenos jardins...





...ou pelas ruelas que são puro charme.


Aliás, é justamente na ponta sul da Cité que fica o recanto mais bucólico que conheci em Paris: a Place Dauphinne, com suas árvores me lembrando que o outono não estava muito longe.



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